2 de out. de 2011

A linguagem do desejo na poesia de Rosa Lobato de Farias -


Poetisa e romancista, Rosa Lobato de Faria nasceu em Lisboa em 1932. Escreveu e publicou vários romances, desde 1995, todos muito bem recepcionados pela crítica. O essencial de sua poesia está reunido no volume Poemas escolhidos e dispersos, de 1997. Em 1999, publicou A gaveta de baixo, um longo poema acompanhado por aquarelas do pintor Oliveira Tavares. 
Do livro Memória do corpo, publicado em 1992, foram selecionadas algumas as poesias, para representá-la neste ensaio, tanto pela renovação estética que nele sobressai, quanto pelo sopro de refinado erotismo que perpassa as linhas e entrelinhas dos seus poemas. A “memória” que conduz a mensagem da autora neste livro segue um itinerário afetivo que se inicia com a memória materna vinculada à infância da autora, a quem dirige os mais belos versos que o amor de uma filha poderia escrever (Minha amante secreta / Meu barco na memória / Razão da minha história / e meu primeiro amor); continua com a revivescência da adolescência (O corpo adolescendo em ventos e sargaços / pôs-se a aprender a lua / as algas as marés / a descobrir em si / gritos ondas e grutas com animais marinhos). Livro da “memória do corpo” em suas várias idades e mutações: memória da delícia mortal / de ter dezoito fomes / de ter dezoito gritos / de ter dezoito anos. Depois vem o tempo da memória da memória / do corpo que há no corpo da saudade. Mas antes de ser saudade, domínios o qual só ela devassa e conhece, a memória do corpo é de novo poema, beijo, afago. / É de novo no corpo que te trago / a exótica festa da nudez 

SONETO DE ABERTURA 
Outra coisa que o corpo há quem conheça. 
Eu não. Somente nele me cumpro viva. 
Poema, beijo, estrela, afago, intriga 
só no corpo me são pés e cabeça. 

E coração também que às vezes teça 
razão de me saber mais que a medida 
nessa trágica trama tão antiga 
a que chamam ficar de amor possessa. 

E é de novo poema, beijo, afago. 
É de novo no corpo que te trago 
A exótica festa da nudez, 

E tudo quanto sinto e quanto penso 
Toma corpo no corpo a que pertenço. 
E aqui estou: de barro, como vês. 

No poema que se segue, a expressão do amor sentimento antecede à do apelo erótico do corpo. A atitude do eu-lírico é mais de súplica, de demanda e expectação que de parte ativa no jogo amoroso: 

De ti só quero o cheiro dos lilases 
e a sedução das coisas que não dizes 
De ti só quero os gestos que não fazes 
e a tua voz de sombras e matizes 
De ti só quero o riso que não ouço 
quando não digo os versos que compus 
De ti só quero um sopro nas janelas 
da casa abandonada dos meus dias 
De ti só quero o eco do teu nome 
e um gosto que não sei de mar e mel 
De ti só quero o pão da minha fome 
mendiga que já sou da tua pele. 

No longo poema que vem a seguir, a atitude do eu-lírico é de cumplicidade e de participação ativa no jogo amoroso. 

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